O que são fake news?
Fake news é uma notícia baseada em dados criados ou falsificados que deliberadamente pretende causar dano a outra pessoa ou grupo. Em geral elas são criadas com base num objetivo político, usando dados da realidade que são manipulados ou tirados de contexto. Em outros tantos casos a criação de fatos completamente descolada da realidade, propagando absurdos completamente indizíveis também pode ser utilizada.
O objetivo de tais notícias é falsear a realidade com base nos medos e aspirações das pessoas, sendo sempre um simulacro da realidade, baseando-se em uma aparência da realidade ou na percepção deturpada de um determinado grupo, que vê na notícia falsa a confirmação de uma “suspeita”.
Recentemente escrevi um artigo sobre fake news e o Senhor dos Anéis, fazendo uma análise da participação da personagem Grima Lingua de Cobra e seu modo de atuar, baseado na manipulação e na disseminação sistemática de inverdades.
O artigo foi publicado no Valinor, o maior portal do brasil dedicado a discutir a obra de J. R. R. Tolkien. Dois comentários, um no site principal e outro no fórum, onde os leitores da comunidade tolkien mais interagem, despertaram a minha atenção. Achei tão interessantes que resolvi reproduzir aqui os comentários e as minhas respostas, e aproveito para fazer alguns acréscimos.
Começo com a parte inicial do artigo, para que vocês saibam mais sobre o que eles estavam comentando:
Fake News e O Senhor dos Anéis: Grima Língua de Cobra
Filho de Gálmód, Grima esteve a serviço do rei Théoden de Rohan, como conselheiro. Ele era conhecido como “Grima Língua-de-Cobra” (ou língua de verme), em referência ao fato de que ele sistematicamente mentiu e enganou, mesmo antes de sua descoberta como agente de Saruman.
Sua descrição física nos livros foi sempre pouco elogiosa: Tinha um rosto pálido e escuro, olhos pesados e caídos, mesmo Saruman não escondia seu desprezo e chamava Grima apenas de Verme.
Ele agiu em nome de seu mestre para enfraquecer o reinado de Théoden, a fim de facilitar a invasão de Rohan. Em “as Duas Torres”, a ação de Grima Língua de Cobra é descrita nos seguintes termos: “Ele foi esperto: entorpecendo a astúcia dos homens e alimentando seus medos, como melhor coubesse em cada ocasião.”
Essa é precisamente a lógica e o fundamento das Fake News, ou notícias falsas. O objetivo de tais notícias é falsear a realidade com base nos medos e aspirações das pessoas, sendo sempre um simulacro da realidade, baseando-se em uma aparência da realidade. Porém, como característica adicional, a falsificação tem um propósito. O que também se aplica aos eventos em que Grima atuou.
Uso sistemático da mentira e da manipulação
A importância do conceito de Fake News não tem a ver com o fato noticiado ou propagado e nem com a fabricação em si. Sua característica fundamental está relacionada com a existência de uma agenda ou objetivo oculto – ou pelo menos não explícito a ser alcançado. Clique aqui para ler artigo completo em Valinor. – Versão do artigo publicado no forum
Os Comentários
Como resposta ao artigo, vieram algumas respostas. A primeira diz que a mídia em geral é uma grande mentira, que inventa coisas sobre “a pandemia e outros assuntos”:
“Fazendo uma analogia simples e trazendo para os dias de hoje no Brasil, Grima se parece muito com nossas Mídias principalmente uma que só faz questão em deturpar as informações referente a pandemia e outros assuntos !!”
Comentarista 1
É inacreditável o grau de generalismo e o ataque às mídias em geral como se tudo o que é publicado fosse uma onda infindável de fake news. As pessoas não conseguem ou não fazem esforço para distinguir uma notícia deliberadamente falsa de uma opinião ou fato divergente em relação ao que elas pensam. Infelizmente é essa postura que leva grandes contingentes de pessoas a compartilhar os maiores absurdos como se fosse “A” verdade.
A minha resposta foi: “É sempre importante lembrar que Fakenews não pode ser definida como a situação em que a imprensa publica algo que contradiga minhas opiniões sobre um determinado assunto, nem quando ela publica coisas sobre determinados políticos que eu preferia que ela não publicasse. No ambiente moderno, as redes sociais são o veículo favorito de propagação delas”.
Outro comentário, esse bem mais longo, embora igualmente sem fundamento:
“Informação se combate com informação. Mentira se combate com a verdade.
Agora calar quem quer que seja é ditatorial.
Você não concorda com fulano? Combata seus argumentos com argumentos melhores.
Ou não o escute. O país é livre, podemos ouvir quem quisermos.
Agora calar o outro é ditadura. É dizer que só é permitido 1 pensamento. Só é permitido 1 partido. Isso é ditadura, isso obviamente não representa toda a pluralidade de idéias existente na população.
Comparar realidade com fantasia é muito frágil. O esquerdista vai colocar a direita na figura de Grima e vice-versa. Então não dá para fazer essa comparação, é o mesmo que comparar uma banana com uma caixa de som: são coisas absolutamente diferentes, não há qualquer ligação.
Essa história de fakenews é simplesmente uma desculpa de esquerdistas para calarem direitistas conservadores.
Nenhuma fakenews tem poder para mudar o resultado de uma eleição. As pessoas estão nas ruas, estão vivendo no país real, de verdade. Se estivessem satisfeitos com o mundo real da época votariam nos mesmos. Se votaram no diferente era porque a realidade não estava boa.
“A mentira tem perna curta”. Fakenews nenhuma tem mais poder de convencimento que a verdade, a realidade.
E se em eleições futuras a maior parte da população estiver descontente com a realidade, pode votar diferente de novo. Só vão reeleger o governo atual se estiverem contentes com a realidade atual. E não há fakenews que consiga fazer a maioria das pessoas se esquecerem da realidade que vivem dia-a-dias no decorrer dos anos.
Democracia é pluralidade de idéias. Chamar a opinião do outro de fakenews só porque o outro não concorda contigo e assim calá-lo… isso é ditadura.
Isso é abrir precedente para que no futuro alguém faça o mesmo contigo.”
Comentarista 2
Comecei a responder simplesmente repetindo a minha resposta a um comentário ao artigo na página principal:
“É sempre importante lembrar que Fakenews não pode ser definida como a situação em que a imprensa publica algo que contradiga minhas opiniões sobre um determinado assunto, nem quando ela publica coisas sobre determinados políticos que eu preferia que ela não publicasse.”
Na sequência reproduzo a sequência de respostas pontuais a cada pedaço do texto do comentarista 2. É de chamar atenção o forte viés conservador ou reacionário do autor. Isso é do perfil de cada um, não é um problema em si. O problema está no fato dele minimizar a importância e o impacto das fake news, apesar de todas as evidências em contrário. todos os trechos destacados abaixo pertencem ao mesmo autor (Comentarista 2), seguidos pelas minhas respostas:
Essa história de fakenews é simplesmente uma desculpa de esquerdistas para calarem direitistas conservadores.
Isso é uma generalização muito problemática. Quadrilhas organizadas e especializadas na disseminação de fakenews estão fartamente documentadas e caracterizadas pela polícia brasileira e internacional. Há quadrilhas de esquerda e de direita, e embora elas sejam muito mais comuns na direita, é um exagero atribuir às fakenews a característica de um fenômeno conservador, apenas.
Nenhuma fakenews tem poder para mudar o resultado de uma eleição. As pessoas estão nas ruas, estão vivendo no país real, de verdade. Se estivessem satisfeitos com o mundo real da época votariam nos mesmos. Se votaram no diferente era porque a realidade não estava boa.
Aqui são duas questões completamente distintas:
1) “Nenhuma fakenews tem poder para mudar o resultado de uma eleição.”
Isso é totalmente inverídico. A história antiga e recente mostra uma infinidade de casos em que a manipulação teve impacto relevante:
The Long and Brutal History of Fake News – Bogus news has been around a lot longer than real news. And it’s left a lot of destruction behind. Escrito por JACOB SOLL em Dezembro de 2016 para a Político Magazine
How fake news was weaponized in Nigeria’s elections – por Stephanie Busari, CNN
Very Few Engaged with Fake News Sources in 2016 Election por Walter Beckwith AMERICAN ASSOCIATION FOR THE ADVANCEMENT OF SCIENCE
Recomendo muito esse documentário especial: Fake news, Memórias e Mercenários, feito pelo Correio Braziliense.
2)”Se votaram no diferente era porque a realidade não estava boa.”
Isso é verdade. O problema é como foi construído o caminho que leva às alternativas escolhidas.
Outra afirmação interessante do comentarista 2:
“A mentira tem perna curta”. Fakenews nenhuma tem mais poder de convencimento que a verdade, a realidade.
Não é bem assim. Nós vivemos num mundo em que contra todas as evidências concretas, muitas pessoas até hoje não acreditam que o homem pousou na lua, nem na teoria da evolução; muita gente recusa vacinar os filhos porque ouviram asneiras criminosas sobre as vacinas. As fakenews funcionam justamente pelo fato de que um número grande o suficiente de pessoas escolhe deliberadamente ignorar a realidade.
Democracia é pluralidade de idéias. Chamar a opinião do outro de fakenews só porque o outro não concorda contigo e assim calá-lo… isso é ditadura.
Esse é o aspecto mais danoso do contexto social em que as fakenews ganham tanta relevância: isso acontece quando a polarização se exacerba e começa a esgarçar o tecido social, elas potencializam isso, fomentando ódio e divisão.
Você fala em chamar a opinião dos outros de fakenews, mas claramente não é isso o que o meu artigo diz. Isso é fruto desse pensamento divisionista do “nós contra eles”, esquerdismo vs direitismo. O Brasil precisa superar isso.
“O objetivo de tais notícias é falsear a realidade com base nos medos e aspirações das pessoas, sendo sempre um simulacro da realidade, baseando-se em uma aparência da realidade. Porém, como característica adicional, a falsificação tem um propósito.”
Nessa breve descrição eu tento mostrar que elas são a falsificação de dados da realidade ou a criação de fatos que deliberadamente pretendem causar dano a outra pessoa ou grupo, com base num objetivo.
Opiniões divergentes não são fake news. Falsificação de dados e propagação de mentiras são fake news.
Isso não tem a ver necessariamente com direita e esquerda. Há grupos de esquerda que dispararam fake news contra candidatos e políticos conservadores, há grupos conservadores que foram constituídos essencialmente fazendo o mesmo contra políticos e grupos progressistas, há grupos de direita que lançaram todo tipo de ataque contra desafetos da própria direita.
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