Composição musical completa mais antiga encontrada até hoje
O epitáfio de Seikilos é a composição musical completa mais antiga encontrada até hoje. Composta no século I, foi descoberta em 1883 por Sir W. M. Ramsay, e incluía a notação musical. A pedra na qual a obra foi encontrada era uma coluna de mármore, usada para marcar um túmulo feminino na cidade grega de Tralles, atualmente parte da Turquia.
O material era usado frequentemente no período, mas demonstra o apreço do marido pela falecida esposa.
Sua datação é, contudo, considerada imprecisa, já que há poucas informações adicionais. Sabemos, no entanto, que situa-se entre os século I e II aC.
Esta é a mais antiga peça de composição musical encontrada em sua totalidade. Com base nesta descoberta, foi possível traduzir as letras e também converter a peça em notação musical moderna que pode ser tocada hoje.
É preciso lembrar que a literatura grega em sua origem, por certo desde os épicos de Homero, assim como os poemas de amor de Sappho, e as tragédias de Sófocles e Eurípedes eram todas, originalmente, músicas. Portanto, o epitáfio nem de longe é a música grega mais antiga, muito menos a música mais antiga do mundo. O que ele possui de diferente é a notação musical que foi preservada e nos permite reconstituir de forma aproximada sua sonoridade original.
A composição é curta e a notação é considerada jônica com características tônicas frígias, embora especialistas musicais encontrem outras caraterísticas possíveis para a composição tônica da obra.
Dedicatória
Σείκιλος Εὐτέρ[πῃ] ²
“(De) Seikilos a Euterpe.” Acredita-se que Euterpe tenha sido esposa de Seikilos.
Indicação
No túmulo há também uma indicação que declara em grego:
Εἰκὼν ἡ λίθος εἰμί. τίθησί με Σεικίλος ἔνθα μνήμης ἀθανάτου σῆμα πολυχρόνιον.
eikṑn hē líthos eimí. títhēsí me Seikílos éntha mnḗmēs athanátou sêma polukhrónion.
As inscrições gravadas na pedra eram, a saber: “Eu sou uma lápide, uma imagem. Seikilos me colocou aqui como um sinal duradouro da lembrança imortal”.
Conforme o nome sugere, a música foi composta e dedicada em memoria à amada esposa de Seikilos, o autor. Apesar de ser em essência um lamento pela morte de um ente querido, a sonoridade da música mais antiga do mundo não necessariamente evoca sentimento de tristeza e nostalgia. A letra carrega acima de tudo uma mensagem sobre a importância de aproveitar a vida.
Ouça a melodia do Epitáfio de Seikilos
A Letra
Ὅσον ζῇς φαίνου | hóson zêis, phaínou | Enquanto viveres, brilha. |
μηδὲν ὅλως σὺ λυποῦ | mēdèn hólōs sù lupoû | De todo não te aflijas, |
πρὸς ὀλίγον ἔστι[2] τὸ ζῆν | pròs olígon ésti tò zên | Pois curta é a vida |
τὸ τέλος ὁ χρόνος ἀπαιτεῖ. | tò télos ho khrónos apaiteî. | E o tempo cobra seu tributo. |
No entanto, Segundo Aimee Lamoureux, outra interpretação possível do texto poderia ser: “Seikilos, filho de Euterpe [ou Euterpos]”, então é possível que a canção fosse realmente dedicada a sua mãe.
A dedicatória, portanto, não seria totalmente clara. Ainda há mistério em relação a quem poderia ser Euterpe e sua relação com Seikilos. A suposição mais comum é a mencionada acima. Os historiadores acreditam que o compositor, um homem chamado Seikilos, escreveu a canção para uma mulher chamada Euterpe, provavelmente sua falecida esposa, e colocou-a nesta lápide para ela.
A letra completa não esclarece as coisas definitivamente a questão:
“Enquanto você viver, brilhe,
Não deixe nada afligi-lo além da medida.
Pois sua vida é curta,
e o tempo cobrará seu tributo. ”
Além da letra, outra peça do quebra-cabeça é a inscrição gravada na estela que diz: “Eu sou uma lápide, uma imagem. Seikilos me colocou aqui como um sinal eterno de lembrança imortal. ”
Não resta dúvida de que a composição é uma espécie de canto de luto, gravada na lápide de um ente querido como um lembrete da natureza fugaz da vida. Nada mais é conhecido sobre quem teria sido Seikilos, ou a quem foi dedicada a peça funerária.
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A Harmonia do Epitáfio de Seikilos
Segundo Francisco José dos Santos Braga:
“A melodia original estava num compasso cuja fórmula aproximadamente corresponde a 6/8 (compasso binário composto). A melodia tem a extensão de 8 compassos e tem certas características, a saber: — não há intervalos maiores do que uma terça (excetuando o intervalo de quinta no primeiro compasso), denotando sua origem vocal— o registro só alcança uma oitava, ou seja, a melodia foi estruturada dentro de uma simples oitava— um motivo descendente (de C# a G natural)— os Gregos usavam as letras maiúsculas de seu alfabeto para denotar as notas da escala— a duração da nota era indicada por uma linha ou outro símbolo sobre a letra — não havia acentos, pontuação e espaços entre as palavras
— a tônica (nota central, mese em grego) aparentemente recai em lá, sendo a cadência: lá-fá#-mi (Cf. moderna notação musical acima)
— Reinach sugere duas fermatas na última nota do 4º e 8º compassos para melhor fraseado e respiração do(a) cantor(a). A canção jônica helenística está no modo frígio (phrygisti), o modo D, com sua tônica na mesma posição relativa da do modo dórico. “
O poema-canção “2:55”, de Luca Argel, menciona um trecho que segundo o poeta carioca Carlito Azevedo, seria uma variação da tradução do último verso do Epitáfio de Seikilos: “O tempo exige o fim” (ou o tempo cobra seu tributo). O trecho aparece entre aspas na letra de Argel.
Para Ricardo Domeneck, “uma citação do O poema de Argel, que é uma coisa de delicadeza e beleza em si, adquire ainda mais potência como diálogo com esta canção tão antiga. Ligando em arco temporal aquele epitáfio e nossa época. Luca Argel, que é professor de Música, responde de forma pungente ao conselho de Seikilos”:
“2:55”, poema e voz de Luca Argel. Vídeo de Bea M. Saiáns.
é o que o luminoso diz:
“o tempo exige o fim”,
não há truque novo dessa vez.
todo mundo tem o direito
de também querer ser triste (um pouco mais)
quando convém.
02:55 – Luca Argel
Exposição do Epitáfio de Seikilos em Berlim
Segundo a Deutsche Welle, uma réplica da estela esteve em exibição, acompanhada por uma gravação em áudio de um coro vienense cantando a canção, no evento que comemorou o 190º aniversário do Instituto Arqueológico Alemão (DAI).
A matéria da DW afirma que “a pedra Seikilos fez parte da exposição “Archaeomusica: Os sons e a música da Europa Antiga”, fruto de um projeto de pesquisa de 5 anos do departamento de Oriente do DAI. Por meio de colaboração interdisciplinar, arqueólogos, fabricantes de instrumentos, etnomusicólogos, músicos e outros especialistas se reuniram para combinar suas pesquisas sobre os primeiros instrumentos da Europa e criar réplicas jogáveis de cada instrumento.”
Na exposição, os visitantes puderam ver e tocar réplicas de alguns dos primeiros instrumentos musicais a serem tocados na Europa, desde o período Paleolítico c. 40.000 a.C. , e também ouvir seus sons por meio de fones de ouvido. O projeto Archaeomusica encerrou-se em 2018, mas os instrumentos permanecem na coleção da DAI.
A trajetória da estela do Epitáfio de Seikilos
O epitáfio Seikilos foi descoberto perto da atual Aydın, na Turquia, em 1883 pelo arqueólogo escocês W. M. Ramsay, esculpido em uma lápide de mármore conhecida como uma estela.
Isso é geralmente aceito, mas a maior parte do resto da história inicial da estela está atolada em informações confusas e relatos conflitantes.
Alguns dizem que Ramsay trouxe a placa para um museu em Smyrna, Grécia, onde foi mantida a salvo até a Guerra da Independência da Turquia com os gregos em 1919. Durante a guerra, a história diz que o Consulado Holandês na Turquia (por que o Cônsul holandês permanece obscuro) levou a estela para fora do país por segurança.
Ao lado dessa história está outro relato que também afirma que Ramsay só encontrou a estela por acidente na residência do ferroviário Edward Purser, que a encontrou enquanto construía a ferrovia Smyrna-Aidin. Sem perceber o que havia encontrado, Purser supostamente conseguiu serrar parte do fundo (danificando irreversivelmente a última linha da inscrição) e dar a estela como um presente para sua esposa, que a colocou em seu jardim, presumivelmente como uma decoração objeto.
Quer essa versão dos eventos seja totalmente verdadeira ou não, é geralmente aceito que o homem não identificado no Consulado Holandês que conseguiu a estela da Grécia durante a guerra a deu a seu genro, que a levou para o Hague, Holanda.
Parece ter ficado lá em segurança até que o Museu Nacional da Dinamarca o comprou em 1966 e o trouxe para Copenhague, onde permanece até hoje.
Bibliografia
https://www.history.com/news/what-is-the-oldest-known-piece-of-music
https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2013/10/131023_musica_grega_antiga_an
https://www.ricardocosta.com/artigo/esteticas-classica-e-medieval
https://ancientlyre.com/the-oldest-written-melody-in-history
https://www.dw.com/en/bringing-europes-stone-age-musical-instruments-to-life/a-48800909
https://concertino1.websiteseguro.com/images/stories/imagens/EPITAFIODESEIKILOS_II_Braga_Editado.pdf
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